Alunos depõem à Justiça por invasão à reitoria da UnB; estudante fica nua
2º mandado de reintegração de posse pôs fim à ocupação de cinco dias.
Grupo pedia não punição de oito alunos por 'catracaços' em 2013.
Estudante fica nua durante protesto na sala do reitor da UnB (Foto: Ricardo Moreira/G1)
Cinco estudantes identificados como líderes da invasão à reitoria da Universidade de
Brasília
foram convocados pela 9ª Vara Federal a prestar esclarecimentos em até
15 dias úteis sobre a ocupação ao prédio, que durou cinco dias e
terminou após determinação judicial. Uma delas, Jaqueline Cardoso, de 22
anos, chegou a tirar a roupa enquanto aguardava a chegada do reitor
Ivan Camargo. Ela disse que tomou a decisão porque ficou indignada com a
postura do administrador, que em todos os momentos pedia que o grupo
retirasse o capuz.
“A gente não é baderneiro. Tocaram o terror, que polícia ia entrar, que
ia prender. Hoje foi a mesma coisa", disse Jaqueline. "Mostre a
desgraça para a UnB, para a Brasília, o Brasil inteiro, do que é ser
líder estudantil na UnB. Estamos fedidos, nus e outros lá embaixo,
encapuzados sendo chamados de fuzileiros, black blocs e nazistas."
Os estudantes protestavam contra a punição de oito alunos suspeitos de
pular as catracas do restaurante universitário em 2013 e liberar a
entrada de outras pessoas, gerando um prejuízo de R$ 29 mil. O reitor
assinou nesta noite um documento em que se comprometia a reabrir as
investigações sobre o caso, conduzidas pelo Conselho de Administração da
UnB. Ele não quis conversar com a imprensa e deixou o local bastante
emocionado.
- Reitor da UnB, Ivan Camargo, assina documento (Foto: Ricardo Moreira/G1)
Os cinco estudantes vão receber assistência da Defensoria Pública da
União, já que são de baixa renda. Graduanda em ciências sociais,
Jaqueline está há cinco anos na UnB e mora em Samambaia.
Funcionários da UnB afirmaram que o elevador utilizado pelo reitor foi
quebrado durante a ocupação dos estudantes. Eles também disseram que uma
porta de vidro que dá acesso à área externa do gabinete do reitor e
duas lâmpadas foram danificadas. O grupo nega e diz que os prejuízos
foram causados pelos próprios servidores.
Lâmpadas da reitoria da UnB que foram danificadas durante a ocupação (Foto: Ricardo Moreira/G1)
Os estudantes desocuparam o prédio na noite desta terça-feira, depois
que a juíza federal Luciana Raquel Tolentino de Moura expediu novo
mandado de
reintegração de posse
e autorizou o uso de força policial para retirá-los. Eles estavam
mascarados e desceram as rampas acompanhados de duas oficiais de
Justiça. Havia cerca de 40 alunos no local.
Mais cedo, os estudantes, representantes da reitoria e defensores
públicos da União negociaram a desocupação do prédio. O reitor Ivan
Camargo
propôs a reavaliação do processo administrativo
e sugeriu que os estudantes sejam defendidos por defensores públicos.
Durante a tarde, o grupo votou pela liberação do espaço, desde que o
reitor assinasse a extinção das ações.
Além disso, a água e a luz da reitoria foram restabelecidos depois que o
grupo cedeu e liberou a rampa de acesso a parte dos decanatos.
Nesta segunda-feira (9), estudantes e servidores realizaram uma
manifestação musical a favor da democracia e contra ações violentas
dentro da instituição. O encontro foi organizado via redes sociais,
depois que o professor Roberto Ellery questionou a postura dos alunos
que ocupam a reitoria.
- Mascarados fechando o acesso à reitoria da Universidade de Brasília (Foto: Isabella Formiga/G1)
A
invasão ocorreu por volta das 16h de quinta, depois da reunião com Conselho de Administração, que decidiu responsabilizar os alunos pelo “catracaço” e por
depredações ocorridas em festas no campus. Insatisfeitos com o resultado do encontro, cerca de 60 estudantes ocuparam o prédio e bloquearam a entrada com cadeiras.
Identificando-se como ligados a cursos de humanas e usando máscaras,
eles também picharam e tamparam as câmeras de segurança com papéis,
virando os equipamentos na direção da parede. Várias faixas foram
espalhadas pelo local, indicando que o grupo pretende não liberar o
acesso.
Câmera tampada com papel e virada para a parede, na reitoria da Universidade de Brasília (Foto: Isabella Formiga/G1)
O reitor, Ivan Camargo, disse que foi “extremamente hostilizado” pelo
grupo no dia. Ele conta que tentou conversar com os estudantes, como
solicitado por eles, mas que foi “absolutamente agredido verbalmente”
durante a tentativa de negociação. Segundo Camargo, o
grupo entrou na sala dele e quebrou várias portas.
“Não há apoio nenhum, ninguém apoia isso.
Meia dúzia de encapuzados fascistas tentando tomar conta da universidade.
Estamos em uma posição muito tranquila de resistência. A gente precisa
se opor, mas a gente não pode se opor usando as armas deles, que são a
violência. A gente não quer a presença de polícia. A gente quer usar
música. A gente precisa de arte, cultura, academia e ciência”, disse o
reitor na ocasião.
Sem se identificar, um dos manifestantes classificou a fala de Camargo
como "ridícula". "Essa é realmente a visão dele dos alunos de classe
media baixa dessa universidade."
Outra jovem disse que a
ocupação ocorre em resposta à decisão de culpar os oitos estudantes envolvidos no catracaço. "É uma perseguição porque tem galera que nem está aqui", afirmou.
A gente decidiu que não queria a criminalização desses estudantes, mas
queria a responsabilização deles, e que obviamente essa
responsabilização poderia ser dada em vários níveis, inclusive no
ressarcimento ao patrimônio público. Foi uma decisão colegiada. A gente
tinha acabado de tomar essa decisão, e aí os estudantes invadem o
gabinete do reitor quebrando portas, enfim."
Andréa Maranhão, diretora do Instituto de Biologia
"A galera pulou a catraca reivindicando coisas, foi um ato de protesto,
e eles estão cobrando R$ 29 mil de alunos específicos. Mas não faz
sentido, não teve depredação, foi uma coisa que não aconteceu. Nem aqui
está acontecendo. O reitor diz que é guerra civil aqui, mas não está
rolando depredação, a gente quebrou só a porta de vidro na hora de
entrar, mais nada", completou a garota.
De acordo com a UnB, cerca de
cem servidores ficaram sem acesso às suas salas
e o trabalho da reitoria estava parado. A instituição aguardava o
cumprimento da reintegração de posse, que deveria ocorrer até a noite de
domingo.
Diretora do Instituto de Biologia e membro do conselho, Andréa Maranhão
disse que a situação estava impedindo que a folha de pagamento dos
servidores fosse rodada.
"A gente decidiu que não queria a criminalização desses estudantes, mas
queria a responsabilização deles, e que obviamente essa
responsabilização poderia ser dada em vários níveis, inclusive no
ressarcimento ao patrimônio público. Foi uma decisão colegiada. A gente
tinha acabado de tomar essa decisão, e aí os estudantes invadem o
gabinete do reitor quebrando portas, enfim.”
Professores
e estudantes realizam protesto com música contra ocupação da reitoria
da Universidade de Brasília (Foto: Isabella Formiga/G1)
O Diretório Central dos Estudante divulgou nota em apoio à
manifestação. "Trata-se de um processo administrativo de reparação de
danos e responsabilização. Não é um processo judicial civil ou penal,
como vem sendo dito. Convém lembrar que todos os envolvidos no processo
têm direito a ampla defesa e contraditório", disse o diretório em nota.
‘Catracaço’
Estudantes contrários à privatização do restaurante universitário
promoveram quatro “catracaços” em 2013, pulando as roletas de acesso ao
refeitório e liberando a entrada de outros colegas. De acordo com o
reitor Ivan Camargo, nunca houve intenção de privatizar o
estabelecimento e sim de mantê-lo terceirizado, sem custos a mais para
os alunos. Ele afirma que os prejuízos com os protestos chegaram a R$
29,3 mil.
Trecho de texto do professor Roberto Ellery, contra invasão à reitoria da UnB (Foto: Facebook/Reprodução)
Na última reunião do Conselho de Administração, os membros informaram
que oito estudantes foram identificados por participar dos movimentos. A
Procuradoria Jurídica da UnB chegou a informar que no caso havia
incidência do artigo 157 do Código Penal (roubo), com pena de prisão
entre 4 e 10 anos. A reitoria optou por manter o processo apenas na via
administrativa, requerendo a restituição do dinheiro para ressarcimento
dos anos.
Não há apoio nenhum, ninguém apoia isso. Meia dúzia de encapuzados
fascistas tentando tomar conta da universidade. Estamos em uma posição
muito tranquila de resistência. A gente precisa se opor, mas a gente não
pode se opor usando as armas deles, que são a violência. A gente não
quer a presença de polícia. A gente quer usar música. A gente precisa de
arte, cultura, academia e ciência."
Ivan Camargo, reitor da Universidade de Brasília
De acordo com a coordenadora do DCE, Gabriela Sarkis, os
envolvidos no catracaço são contrários à ocupação. Ela afirmou acreditar que a pauta dos estudantes é válida, mas não a forma de manifestação.
"Antes a gente tem que tentar as vias institucionais, e não foi isso
que aconteceu. No primeiro [ato], não vamos ocupar, depredar o
patrimônio público, quebrar a porta do gabinete e entrar. Isso foi
errado. Até porque, dos oito estudantes que iniciaram esse movimento e
estão sendo processados pelo catracaço, seis são contra a ocupação. Eles
estão falando em nome de oito, sendo que seis não se sentem
representados por essa ocupação", declarou ao
G1.
O grupo de mascarados, que afirma que a invasão foi motivada pela
punição aos oito identificados, afirma que só vai deixar o local quando
os processos forem arquivados.
"Na outra ocupação liberamos a reitoria e ele não cumpriu com nada",
disse uma jovem. "A principal coisa é a criminalização. Queremos que
arquive. Um dos motivos da gente estar mascarado é o medo de
simplesmente identificarem a gente e aleatoreamente nos processar sem
provas concretas.”
O reitor da UnB, Ivan Camargo Foto: Lucas Nanini/G1)
O grupo também diz que é contra a punição a centros acadêmicos por
causa de problemas em happy hours. Na última quinta-feira, um evento no
Instituto Central de Ciências, principal prédio da UnB,
terminou com agressões e três tiros.
"Houve baderna e tudo mais mas eles estão acusando aqueles que não
foram os provedores", disse. "Que fique claro que os happy hour são um
processo da cultura universitária, da convivência, da troca de ideias",
diz um jovem. "Não é festa por festa. É uma festa que tem uma
politização por trás."
Ao
G1, o reitor disse achar improvável que o processo
contra os estudantes envolvidos no catracaço termine com os oito alunos
sendo jubilados. "Não, a questão do restaurante, acho que não tem
nenhuma condição de [esse grupo] ser jubilado. Mas invadir a reitoria,
quebrar as coisas lá dentro, isso eu considero gravíssimo", disse
Camargo.
Fonte:G1.com