O Conselho Nacional de Educação (CNE) vai propor, em audiência pública
nesta quarta-feira (26), que a graduação em medicina no Brasil seja
mantida com a duração atual, de seis anos. A proposta, elaborada por uma
comissão coordenada pelo presidente da Câmara de Educação Superior,
Gilberto Gonçalves Garcia, também passa a obrigar que todos os
estudantes de medicina passem no mínimo 30% do período de internato, a
parte prática da graduação, atuando na atenção básica do Sistema Único
de Saúde (SUS). Atualmente, a atuação no sistema público era apenas
sugerida, mas não exigida pelas diretrizes nacionais.
Segundo Garcia, a proposta tem sido debatida nos últimos cinco meses
com diversos interlocutores, entre eles os Ministérios da Saúde e da
Educação e entidades representativas da classe médica, nas instituições
de ensino superior e de estudantes de medicina. De acordo com a lei que
criou, em 22 de outubro do ano passado, o Programa Mais Médicos, o CNE é
o órgão responsável pela definição das diretrizes curriculares
nacionais.
Nesta terça, ela será apresentada à sociedade e, a partir dessa
discussão, será concluída e enviada ao ministro da Educação, José
Henrique Paim, para homologação. O prazo para que as novas diretrizes
sejam implementadas é de 180 dias a partir da promulgação da lei. Se
sair do papel, ela atualizará as atuais diretrizes, vigentes desde 2001.
No ano passado, quando instituiu o Mais Médicos, o governo federal anunciou que estudava a
ampliação da duração do curso de medicina de seis para oito anos, para incluir na graduação um estágio obrigatório no SUS.
A ideia acabou não vingando e, em outubro, quando a lei foi promulgada, não havia menção a essa mudança. Em entrevista ao
G1,
o presidente da Câmara de Educação Superior explicou que a decisão do
conselho de manter a atual duração do curso foi feita com base na
proposta de reformular a residência médica, curso de pós-graduação,
equivalente a uma especialização. Nesse caso, a proposta é exigir que
todos os alunos já formados que quiserem fazer residência em qualquer
área da medicina passem por pelo menos um ano de residência em medicina
geral de família e comunidade.
Na graduação, os estudantes têm dois tipos de formação: a teórica e a
prática, com o chamado internato, um tipo de estágio clínico
supervisionado. A nova proposta não muda essa estrutura. Já a residência
médica atualmente varia de acordo com a área de especialização, e será a
primeira vez que serão definidas diretrizes específicadas para essa
especialização. Segundo Garcia, hoje existem normativas. "Agora estamos
pensando junto com a Comissão Nacional de Residência Médica para que a
gente complemente as diretrizes da graduação com diretrizes da
residência médica."
Principais alterações da proposta do CNE:
- Definir a carga horária mínima do curso de graduação em 7.200 horas,
em no mínimo seis anos (atualmente, não existe definição)
- Tornar obrigatório o estágio no SUS, cumprindo 30% da carga horária do internato na atenção básica e serviço de emergência
Diploma só com estágio no SUS
Mesmo mantendo a duração atual da graduação, a proposta que o CNE
debaterá nesta quarta já sugere tornar obrigatório para todos os
estudantes de medicina o estágio nas áreas de atenção básica e serviço
de urgência e emergência do SUS. Segundo o projeto, esse estágio será
parte do internato, que já acontece atualmente, embora, pelas diretrizes
vigentes, a atuação no sistema público de saúde seja apenas uma
sugestão, mas não uma obrigação.
Se aprovada, a proposta definida pelo conselho dividirá o internato em
duas cargas de trabalho: 30% das horas corresponderão necessariamente ao
trabalho no SUS, que pode ser realizado em períodos de até 44 horas por
semana, sem extrapolar jornadas de 12 horas diárias. O restante da
carga horária será destinado ao estágio nas áreas de clínica médica,
cirurgia, ginecologia-obstetrícia, pediatria, saúde coletiva e saúde
mental, desde que nenhuma área some mais de 20% do tempo dedicado à
prática clínica.
No total, o internato deve corresponder a, no mínimo, 35% do total da
carga horária do curso de graduação, o que equivale a cerca de dois
anos. Hoje em dia, essa porcentagem, assim como a duração total de seis
anos na graduação, já são regras seguidas pelos projetos pedagógicos dos
cursos de medicina no Brasil, apesar de as diretrizes vigentes não
mencionarem essa duração.
"Era praticamente a mesma carga horária, mas agora ela está
regulamentada. Era uma prática que agora está no papel", explicou
Garcia. A graduação, segundo a proposta, deve ter no mínimo 7.200 horas,
dispostas em pelo menos seis anos de curso.
O coordenador da comissão disse que a proposta sobre a divisão horária
das partes teórica e prática fala apenas de porcentagens. Mas,
considerando os valores dispostos no texto, a carga horária do internato
deve ser de no mínimo cerca de 2.500 horas, pouco menor que na regra
atual. Assim, o estágio obrigatório no SUS equivale a aproximadamente
750 horas. Um estudante que seguir as indicações máximas de horas de
trabalho por semana (44) no internato levará, no mínimo, quatro meses e
meio para concluir essa etapa de sua formação.
CRONOLOGIA
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08/07/2013: Governo anuncia aumento da duração do curso de medicina de seis para oito anos, para incluir estágio obrigatório no SUS
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16/07/2013: Após repercussão do anúncio, governo cria comissão de especialistas para debater nova lei
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31/07/2013: Governo anuncia mudança do estágio obrigatório no SUS da graduação para a residência médica
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22/10/2014: Medida Provisória do Mais Médicos,
convertida em lei federal, é promulgada; CNE é indicado para formular
novas diretrizes em até 180 dias
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25/02/2014: CNE agenda audiência pública para apresentar proposta das diretrizes
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Diretrizes mais detalhadas
Garcia explica que, além de considerar as mudanças propostas pelo Mais
Médicos, a comissão que elaborou o documento também levou em
consideração outras melhorias nas diretrizes atuais. Agora, os objetivos
do curso são centrados em três áreas: a atenção à saúde, a gestão em
saúde e a educação em saúde.
Além disso, as regras sugeridas são mais didáticas e menos genéricas
que as atuais. "Ela avança na continuidade do progresso que já foi feito
lá atrás, em 2001, no sentido de tornar a diretriz mais didática e
acessível, que de fato tenha condições de repercutir nos projetos
pedagógicos das instituições. Agora é fácil transferir as diretrizes
para o projeto pedagógico."
Além disso, as comissões do MEC responsáveis pelas visitas periódicas
aos cursos, para autorizar seu funcionamento ou renovar seu
reconhecimento, poderão usá-las como "um novo instrumento da avaliação
permanente e regulada".
Se aprovada, a proposta deverá ser implementada em um prazo de até um
ano nas instituições que já têm cursos de medicina abertos. Já as
universidades particulares e públicas que estão atualmente com processos
de abertura em fase de avaliação pelo MEC terão que aderir às novas
diretrizes antes de oferecer vagas. O prazo para a entrega do documento
final, de acordo com Garcia, até o fim de março.
Fonte: G1.com