A Bíblia é um dos livros mais lidos, comentados e estudados desde que foi escrito ainda na Antiguidade ! Por isso, e principalmente pela questão da fé que está embutida em seu texto, ela é uma obra controversa. Afinal, as palavras contidas nesta obra são, para muitos fiéis pelo mundo afora, não apenas palavras, mas sim fonte de inspiração dada por Deus.
Não querendo entrar aqui no mérito de se a Bíblia é ou não um livro escrito somente pela vontade humana, ou pela divina, gostaria de apresentar um texto que pode ajudar na compreensão um pouco melhor do que ele quer dizer. Como vocês já sabem de nossas aulas, assim espero, os números, por toda a história humana, desempenharam um papel importante. É por isso que vemos, por exemplo, um estudo tão antigo como a Cabala usando da “numerologia” para compreender, entre outras coisas, o próprio Universo e até mesmo o próprio Deus. É neste sentido que vemos aparecer vários números dentro da Bíblia, e eles não são somente números aleatórios, pois todos têm um significado “oculto”. Por exemplo, Jesus jejuou 40 dias antes de começar o seu ministério, por 40 anos o povo judeu vagou pelo deserto em busca da Terra Santa, por 40 dias e 40 noites durou o Dilúvio, entre outros.
É para de tentar mostrar que esses números que aparecem na Bíblia têm um significado “além do número”, pelo menos para aqueles que acreditam, que quero deixar um texto para que vocês possam aprender um pouco mais sobre o assunto. Ele foi escrito por frei Acílio Mendes, um Franciscano português, por isso pertencente à Igreja Católica. Espero que gostem e que possam aprender que em um texto muitas vezes o que está subjacente, ou seja, que não aparece claramente, pode importar mais do que o próprio texto.
Devemos prestar muita atenção ao valor dos números na Bíblia, sobretudo no texto hebraico, pois estamos diante de uma mentalidade diferente da nossa. Os números, na maioria das vezes, não querem transmitir uma quantidade exacta, um dado preciso, mas sim expressar uma realidade, um valor teológico, um dado simbólico.
Vejamos o significado dos principais números e alguns exemplos interessantes, assim como algumas passagens bíblicas onde o número aparece:
1 (um): Deus é Um (Dt 6,4; Zc 14,9)
2 (dois): É o par perfeito. Dos animais puros, Noé levará para a arca sempre pares (Gn 7,2). É o dobro e pode significar "de sobra", como em Is 40,2; 61,7; Ap 18,6.
3 (três): Número da unidade e da Trindade. É usado para reforçar ou dar ênfase a uma expressão. Assim, quando se quer dizer que Deus é Santo, repete-se três vezes: «Deus é Santo, Santo, Santo» (Is 6,3; Ap 4,8). Deus abençoa três vezes (Nm 6,24-26). Três são os mensageiros que anunciam o nascimento de Isaac (Gn 18,1ss). É o número da plenitude (Ap 21,13) e da santidade (Ap 4,8).
4 (quatro): Número da totalidade: os quatro cantos da terra; quatro evangelhos; quatro Seres vivos (Ap 4,6; 7,1; 20,8). Os quatro elementos do universo: terra, fogo, água e ar. Quadrangular (Ap 21,16). Representa sinal de plenitude.
5 (cinco): Cinco dedos da mão. O primeiro bloco da Bíblia (a Lei) tem 5 livros, o Pentateuco. No Apocalipse pode ser negativo.
6 (seis): Número imperfeito, não chegou à perfeição, que é o número 7. No Apocalipse (13,18) é repetido três vezes, por isso o número da besta é 666. Imperfeição total!
7 (sete): É a soma de 4 + 3. Por isso é o número perfeito, indica o máximo da perfeição (Nm 23,4; Mt 15,36); grande quantidade (Is 30,26; Pr 24,16; Mt 18,21); totalidade (Ap 1,4); indica séries completas como no Apocalipse: 7 Cartas (Ap 2-3); 7 Selos (Ap 6,1-17); 7 cabeças (Ap 12,3). O Cordeiro imolado recebe 7 dons (Ap 5,12). O sábado é o sétimo dia; Deus fez a Criação em 7 dias; a festa de Pentecostes acontece 7 vezes 7 dias depois da Páscoa. Cada sétimo ano é sabático (descanso para a terra e libertação dos oprimidos – Lv 25) e depois de 7 vezes 7 anos vem o Jubileu. Não se deve perdoar 7 vezes, mas 70 vezes 7 (Mt 18,22). É importante ver que no Apocalipse aparece a metade de 7, isto é 3,5 (Ap 11,9). Às vezes diz-se: um tempo, dois tempos, meio tempo (Ap 12,14; Dn 7,25), isto é três anos e meio. Também pode ser 42 meses (Ap 11,2), é igual a 1.260 dias (Ap 12,6), isto é, sempre a metade de 7. É a duração limitada das perseguições. É o tempo controlado por Deus.
8 (oito): É sete mais um, é como que o transbordar da plenitude. As bem-aventuranças em Mateus são sete mais uma (Mt 5).
10 (dez): Indica grande quantidade (Gn 31,7) ou é simplesmente um número redondo (Mt 25,1). Indica também listas completas. Pelos dez dedos das mãos é fácil lembrar a lista. Indica um tempo limitado; curta duração (Dn 1,12.14; Ap 2,10). Pode indicar também imperfeição: a besta só tem 10 chifres (Ap 12,3).
12 (doze): É o resultado de 4 vezes 3, isto é um número bem completo. É o número da escolha: 12 tribos no AT; 12 Apóstolos no NT; 12 legiões de anjos (Mt 26,53). Os anciãos são 24, isto é: 2 X 12 (Ap 4,4). Os que serão salvos (Ap 7,4) serão 144.000, isto é 12 X 12 X 1000! Número de totalidade (Ap 21,12-14).
40 (quarenta): Número que indica um tempo necessário de preparação para algo novo que vai chegar: 40 dias e quarenta noites do dilúvio (Gn 7,4.12); 40 dias e 40 noites passa Moisés no Monte (Ex 24,18; 34,26; Dt 9,9-11; 10,10); 40 anos foi o tempo da peregrinação pelo deserto (Nm 14,33; 32,13; Dt 8,2; 29,4, etc.); Jesus jejuou 40 dias antes de começar o seu ministério (Mt 4,2; Mc 1,12; Lc 4,2); a Ascensão de Jesus acontece 40 dias depois da Ressurreição (Act 1,3). Quando alguém errava, era corrigido com 40 chicotadas (Dt 25,3) e Paulo também recebeu cinco vezes as 40 chicotadas menos uma (2Cor 11,24).
70 (setenta): Jogo de números 10 X 7. Moisés comunica o espírito profético aos 70 anciãos (Nm 11,16-17.24-25). O exílio na Babilónia é interpretado como a duração de 70 anos (Jr 25,11; 29,10; 27,7; 2Cr 36,21; Dn 9). A tradução da Bíblia hebraica para o grego foi feita por 70 escribas e por isso recebeu o nome de LXX ou Septuaginta.
1000 (mil): Uma quantidade tão grande que não se pode contar. Prazo de tempo completo e comprido. Reino de mil anos (Ap 20,2). Ver as combinações: 7 X 1000 (Ap 11,13; 12 X 1000 (Ap 7,5-8); 144 X 1000 (Ap 7,4). É interessante também notar como os hebreus faziam combinações de números. Por exemplo: Abraão fez a Aliança com Deus quando tinha 99 anos (Gn 17,24), assim a Aliança completou o número 100. É o sábado que dá valor aos demais dias da semana, assim transforma os 6 dias (imperfeitos) em 7 dias (perfeito). O único dia da semana que tem um nome. Outro exemplo: seis povos habitavam a Terra Prometida (Ex 3,8). Mas são imperfeitos. Israel será o sétimo povo, aquele que tornará a terra perfeita (7). Ver também o jogo num rico feito na elaboração de alguns provérbios (Pr 6,16-19; 30,15-33).
Interessante é saber que os israelitas escreviam os seus números com letras alfabéticas (não tinham vogais). Assim podia-se escrever um nome com um valor numérico genial. Por exemplo, Mateus divide a genealogia de Jesus em três grupos de 14 gerações. Ora, o número 14 é o resultado das somas das letras do nome de David (d + w + d): 4 + 6 + 4 = 14. Então Jesus é três vezes David, é o David por excelência.
Em Ap 13,18, o famoso número da "besta do Apocalipse" é 666, que provém da soma das consoantes hebraicas (n + w + r + n + r + s + q) de KAISAR NERON: Imperador Nero, o grande perseguidor dos cristãos (100 + 60 + 200 + 50 + 200 + 6 + 50 = 666). Ou «César Deus», no grego.
Hoje poderíamos fazer o mesmo com o nome do Bush (que tanto mal faz ao mundo!). Ora, o nome completo dele é: George (6 letras) + Walker (6 letras) + Bush Jr (6 letras), ou seja: 666! O número da Besta do Apocalipse!
No capítulo 17 do Evangelho de João, a palavra «mundo» aparece 18 vezes, isto é: 6 + 6 + 6. Ora, para João não é a terra ou o mundo - como nós entendemos hoje - que era mau. «Mundo» significava: o sistema, ou seja, aqueles que não aceitavam Jesus (podiam ser os judeus do Templo ou também os romanos).
No capítulo 9 do Evangelho de João, o verbo «abrir» aparece 7 vezes, justamente no relato em que Jesus abre os olhos ao cego; um sinal importante no quarto Evangelho.
Muitas vezes, no AT, fala-se de personagens que viveram idades incrivelmente avançadas (Matusalém viveu 969 anos: Gn 5,27; Noé viveu 950 anos: Gn 9,29). Neste caso os números têm um valor simbólico. Querem indicar que estas foram pessoas importantes, fiéis a Deus, e que a época em que elas viveram foi de muito valor. Quanto maior o número de anos, mais importante essa pessoa foi diante de Deus.
Outro exemplo: na expressão «filhos de Israel» temos também um exemplo de como os escritores bíblicos gostavam de fazer os jogos de palavras baseadas no valor numérico das letras do alfabeto hebraico. Em laer’f.yI ynEB. (filhos de Israel), a soma dos valores das consoantes é: 2 + 50 + 10 + 10 + 300 + 1 + 30 = 603. Isto é a cifra da multidão do primeiro total do povo no recenseamento antes de partir em direcção ao Sinai: 603.550 (Nm 1,46; 2,32). É o mesmo número dos homens que deixaram o Egipto (Ex 12,37).
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